sábado, 27 de outubro de 2012

Saudade

A saudade dói
E quando não dói, mata
Quando não mata, destrói
Quando não destrói, corrói

Corrói a alma e o coração
Por dentro, as entranhas e o pulmão
Por fora ela mora no semblante
De quem está triste e distante

Saudades...
Da amizade
Da viagem
Dos momentos
Do contentamento
De alguém
De ninguém...

A saudade é a lembrança
Daquilo que se foi
A saudade vem com a esperança
De deixar tudo pra depois
E reviver
(E viver!)
Aquilo que não se pode jamais retardar:
O tempo

De dor e solidão

te vi passar. De terras longínquas. De neverland, da terra-do-nunca. Nunca vi, só ouvi. E com tal simplicidade e emanando grandeza de dentro de si ao mesmo tempo que não ali - não coube a mim fazer essa cena valer. Simplesmente paralisado. Apedrejado. multiplicado. Dores de parto; mal-amado. Indesejado, suplicado, pedido, negado. Pedido negado. Amor não-correspondido. Final. Fim. Triste, infeliz, como me diz. O coração. Doce canção. Zoada, bateria, sem criatividade, na melodia - sim! Triste melodia, da alegoria, sem criação, sem ritmo nem acompanhamento - canção no relento! [da criancice, brincalhona, na lona do circo, do cisco do mito do início: o amor.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Amor que é paixão

Ia te escrever todos os dias. A ti dedicar amor eterno e incondicional. Mas não tenho estômago pra isso - aliás, ninguém tem! Dedicar amor a quem não quer a dor. Sentir a dor por que não quer amor - o meu amor! Amor? Amor exige reciprocidade; amor não existe. Existe sim, paixão, compaixão, afeto, dedicação... Se amor existisse eu te amaria por toda a minha vida e só a ti amaria. Pelo nada sempre esperaria. Tudo por ti faria. Sem nada em troca - sim, eu faria! Mas eu não amo. Não, pelo menos, no sentido mais utópico. Eu exijo em troca amor em igual capacidade, em igual aceitação. Eu exijo que me dês de boa vontade, na bandeja, o teu coração. Eu exijo de ti tudo o que todos exigiriam, amor! Mas um amor que é paixão.

sábado, 20 de outubro de 2012

Apenas mais uma poesia oca

Estou com saudades de nada
Estou com saudades de ninguém
Porque nunca tive nada
Muito menos alguém

Estou com sede da sequidão
Estou com fome do vento
Por que talvez tivesse sede um dia
E o vento quisesse me levar

Hoje eu sou um nada
Pó e cinza - o que, aliás, eu apenas fui
Hoje é o futuro escuro
Do passado em branco

- E amanhã?
Amanhã, apenas mais uma poesia oca...

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Mil vezes melhor

A verdade é sempre compensadora, mas dói quando aquele mundinho no qual firmamos os nossos pés desaparece. Passamos alguns segundos de vertigem, tentando encontrar respostas, ficamos totalmente alucinados, sem saber ao que (ou a quem) nos apegar. Apegar, sim! Essa nossa primeira reação de compensar aquele vazio é simplesmente desesperada e desesperadora. É também irracional. Mas às vezes precisamos abrir mão de certos valores, de certos amores, de certas verdades, pra provar da vida a vaidade. Vaidade dos nossos desejos, experimentar o valor de nossos anseios mais ocultos, mais sem-nexo. Às vezes é necessário desapoiar o cotovelo da base à qual ele já prende a nossa circulação sanguínea há tempos. É preciso provar que nessa vida nada é para sempre; de tempos em tempos aparecerão novas verdades absolutas – e absurdas! – que farão parecer que os nossos dias são mil vezes melhores que os anteriores. Mas, claro: dias passados não são apenas dias passados. É do passado que vem o presente. E é com o passado que se constrói o futuro.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Ser alguém

O que é ser alguém para você?
Será que és alguém?
Será que serás um dia?
Neste mundo, vasto mundo
Todos somos ninguém

O que queres conquistar?
Onde queres chegar?
Queres glória, mérito, fama?
Me diga o que queres
Mas o que realmente queres
E, então, eu te direi o que serás:

- Serás um produto,
Apenas mais um fruto...

Do pó!

- Do pó vieste, ao pó voltarás!

Tudo virará pó
Pó ou cinzas
Cinzas ou ferrugem
Vermes e esquecimento

- Sim! Aqueles mesmos vermes que pisas
Devorar-te-ão quando estiveres abaixo...

No chão!

Nada vale a pena
Pois tudo custa a pena
Essa é a lógica, o sentido e a razão
O homem sempre será inútil
E, quando um dia viver como inútil
Talvez torne-se menos fútil

sábado, 13 de outubro de 2012

Que rime, por favor!

Sem eira nem beira
Na beira do precipício
Sou arisco e arrisco
Inda há risco
Só um traçado
Transforma-se numa rachadura
Por um fio
Num filme
Que rime por favor!

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Inverno

No dia em que fui mais feliz eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir
De lá pra cá, não sei...
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno (...) é quase glacial

Há algo que jamais se esclareceu:
Onde foi exatamente que larguei
naquele dia mesmo
o Leão que sempre cavalguei?

Lá mesmo esqueci que o destino sempre me quis só
No deserto, sem saudade, sem remorso, só
Sem amarras, barco embriagado ao mar
Não sei o que em mim só quer me lembrar
Que um dia o céu reuniu-se à terra um instante por nós dois
Pouco antes do ocidente se assombrar


(Adriana Calcanhotto, Antonio Cícero)

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Detalhes inúteis

Vivo tímido e quieto. Frio por fora, mas bem aquecido por dentro. Olhos caídos e totalmente desatentos à realidade ao meu redor. Lembro-me apenas dos detalhes inúteis. Vivo a irrealidade dos sonhos utópicos aos quais se resume a minha vida. Não tenho tampa, apenas um alto-falante. À minha frente estão as fitas isolantes e os locais onde ocorreram os fatos. Não reclamo do mau cheiro vindo da cidade, ao contrário, ele me alucina. O que no me gusta é o cheiro das pessoas. Esse sim é podre - verdadeiramente fétido!
Um fato intrigante é que o nada me prende e me afasta; uma brisa suave me basta. Gosto das folhas caindo; o barulho do vento me assusta. Tenho pavor do mar, mas gosto da contemplação, da imensidão, da solidão; a Lua - esta sim me encanta! céu repleto de estrelas, sem barulhos, sem aquele turbilhão de mentiras e hipocrisias do meu povo. Gosto do abraço do beijo e do beijo do abraço - sem tirar pedaço! Me encanta a dança, as luzes, o palco, o auditório, o repertório. Gosto da chuva e do frio, arrepio! Bronzeio-me no sol e calor, o seu frescor! Odeio adulação, adoro complicar, mas de amor não quero mais falar. Por enquanto só eu, eu só.

domingo, 7 de outubro de 2012

Feliz infeliz

Saudades de quem já magoou meu coração
Vontade de quem me abandonou
Tristeza pelos olhos indiferentes,
mas cheios de ternura.

Distância infeliz que sempre traz desgraça
sobre a vida dagente.
Feliz distância que me faz perceber
o quanto sou menor,
que me faz ver que sou menos,
e que o céu é maior.

Que vontade de esquecer
teu gosto no mar, no céu e na terra.
O cheiro do gosto.
O palpar das luzes dos olhos.
Que caminho vejo (não, não vejo!)
à minha frente lindo caminho - não vejo!
Vejo espinhos - não vejo lindo caminho!

Ai que tristeza! Que nostalgia!
Ai, no peito, que agonia! -
Não, não vejo!
Não, não sinto!
Ai, eu minto. Adeus.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Um sorriso nem sempre termina em alegria. Às vezes é só um prenúncio da tragédia que abaterá sobre os pobres algozes de si mesmos.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Pedaço de papel

Sou um pedaço de papel
E em mim escreveu-se várias declarações de amor.

Num belo dia quente, amassaram-me
E jogaram fora bem na hora da chuva.
Caí numa poça de água e lama;
me borrei todo de tinta.
De repente, um caminhão passa por cima
E tritura tudo o que havia restado.

Meu sentimento não vale nada.
Sou um pedaço de papel triturado,
Sou o amor despedaçado
E todos aqueles versos disperdiçados.